16 de maio de 2009

Íris

Foi como que por engano ter acordado num dia 16 de maio, tempo frio e raivoso. A cama parecia irritada comigo, me fazendo acordar durante infinitos momentos para novamente voltar a dormir sentindo todo o peso do sono mal dormido. Sonhei sonhos mal sonhados, daqueles que ficam só os relances, as sensações vagas, o medo e o desejo.

Foram horas de muita agonia e desperdício, de relaxamento e proveito. Essas horas que dormi foram muitas. O pé mal sentia o frio no gélido e morto chão que, em qualquer outro dia frio me faria tremer os dentes e arrepiar os pêlos. O chão estava quente e a janela estava aberta, assoprando no meu corpo misto de quente e frio. O escuro se tornava por alguns instantes de ventania um pouco mais iluminado, deixando assim a vista alguns dos meus livros e o meu próprio quarto. O vento também insitava o meu olfato, fazendo com que eu sentisse todo o cheiro do mundo lá fora, do frio lá fora, do frio aqui dentro. E o meu olfato não sentiu o meu cheiro como de costume. Um ritual incontrolável, onde meu corpo demonstra vida própria, mostrando-me que eu sou dele.

O cheiro de eu impregnado no pijama fino e azul claro, mangas largas, calças leves. O cabelo denotando toda uma preocupação em mostrar em si, meu estado. Os olhos, quase fechados como sempre. A boca, seca como O Coração do Esquecido. O chão já não era mais tão quente e afável. Suas agulhas penetravam meus nervos, rasgando todo o meu prazer de manter-me inerte em mim durante um tempo pouco, tempo esse, sempre eterno e válido. Alguns poucos livros encima da mesa farfalhavam as folhas com o vento. Via páginas de textos distantes e tão próximos quanto o Sol da Lua. Precisava procurar um calçado.

Mover-me não era fácil assim. Locomover-me então, era de um progresso descomunal. Mas eu tinha de ir, tinha de fazê-lo. Calçar meus chinelos talvez me desse mais alguns minutos de uma boa respiração. Dois passos e os encontro, juntos, um ao lado do outro em perfeita simetria, no lugar onde sempre deixo. Pés em chinelos, olhos já na sala,eis que muda o ar. De frio-intenso-não-frio, a atmosfera torna-se absurdamente abafada. Lógico, estava amena para mim, mas completamente abafada para pulmões congelados, que logo se sentiram atacados pelo inimigo e provocaram em mim o infalível e inevitável afogamento das minhas respirações. Estava mais uma vez com a respiração dificultada.

Sim, eu sofro de dificuldades respiratórias. Ninguém nunca percebeu, ninguém nunca reparou. Na verdade veio-me à memória de um dia na minha quinta série, quando o tempo não era muito diferente do de hoje e o vento batia em minhas costas. Quando uma linda garota que estava enrolada em meus braços com seu casaco marrom e olhos verdes, emoldurados em um rosto branco e pintadinho, com cabelos negros feito o medo, disse-me: " - Você tem uma respiração muito forte. Isso não te faz mal? "
Respondi que eu sempre havia respirado assim. Então ela me indagou:
" - Já foi a um médico? Você pode ter alguma dificuldade e não saber. "
De fato, ela sabia. Ela sempre soube, sempre reparou, mas nunca havia comentado. Depois desse dia, eu sempre reparei e reparo na respiração das pessoas.

Sempre.

Algumas vezes eu lembro dela, quando as minhas narinas abrem deseperadamente procurando pelo ar que me falta. Quando a minha pulsação aumenta, tentando bombear mais vida em mim. Novamente hoje, com o vento nas minhas costas me rasgando a alma, eu senti aquele calor humano e vi, vi novamente tão de perto aqueles lindos olhos. Quem dera poder respirar o mesmo ar que ela novamente.

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