
Intrigante. Será que me sou levado pelas rédeas da influência ou, perco-me, distante de mim, dentro de outro alguém? A leitura de um breve livro pode criar toda uma revolução civil aqui dentro e, olhem lá, sou um brasileiro...
A leitura de Carta ao Pai, de Franz Kafka, livro que deveria ser lido por todos aqueles que chegam a uma conclusão definitiva sobre seus progenitores (não porque o livro os faria mudar de ideia; simplesmente ele acrescenta, seja lá qual for 'a conclusão'), é absurdamente útil não só nesse discutível assunto. Foi e é, será sempre aliás, uma das grandes obras de cunho psicoreflexivo. Literatura fora da área psicológica, mas que se enquadra por seus mérito de desenvolvimento mental. E olhem que este livro, era uma carta. Uma carta ao próprio pai.
O livro dói. Uma dor boa, uma dor que ensina. Uma daquelas que você se sente identificado e, na verdade, se você for capaz de discernir isso, não "se identificou". Foi só mais uma confirmação.
Admirei-me também da nociva habilidade kafkesca de conseguir por em palavras o que gostaria, mesmo ele próprio tendo me advertido de que não seria totalmente completa a passagem, a troca de palavras entre ele e o papel, e entre o papel e seu pai:
"(...) Tu me perguntaste recentemente por que afirmo ter medo de ti. Eu não soube, como de costume, o que te responder, em parte justamente pelo medo que tenho de ti, em parte porque existem tantos detalhes na justificativa desse medo, que eu não poderia reuní-los no ato de falar de modo mais ou menos coerente. E se procuro responder-te aqui por escrito, não deixará de ser de modo incompleto, porque também no ato de escrever o medo e suas consequências me atrapalham diante de ti e porque a grandeza do tema ultrapassa de longe minha memória e meu entendimento."
Devem ter percebido como o Pai (sim, maiúsculo) de Franz o punha medo. Se tiverem como ler, leiam-no. É primoroso, e atrevo-me a dizer ainda indispensável, aos que gostam de entender.
Esse é apenas o texto desesperado de alguém que encontrou no desespero de outrem a calma, momentânea, que seja, mas é calmaria ainda, pois me achei confirmado em Carta ao Pai, ou mesmo em Kafka, ousando novamente. Sempre foi e acredito que sempre será reconfortante esse entendimento mútuo, essa confirmação.
Pois que é... será que me agrada a confirmação, ou será a reciprocidade?
Different names for the same thing, comum é a confusão ao identificarmos o que pensamos. Muitas vezes os pensamentos certos se perdem nas palavras erradas e, pelo menos dessa vez, consegui me salvar. É a confirmação; a reciprocidade está parte embutida no texto, e outra em mim mesmo. Em todo o meu Eu.
É belo também absorver palavras dele, ao passo de que o livro todo é um pedido de amor, de carinho paterno. É também uma tentativa, seja do que for. Talvez uma tentativa de viver com amor. Enfim, é belo ver que existiu um Homem, um Homem do sexo masculino, frizando bem, que com uma sensibilidade imensa desferiu palavras que poderiam muito bem ser interpretadas como auto-humilhantes. Ele correu riscos, ele perdeu para sí próprio, afim de ganhar por todos. Sacrifício.
Todo bom livro sempre me provocou uma revolução. Mas dessa vez, foi uma revolução civil. Uma revolução do povo, da gente, da Humanidade. Não foi uma revolução movida pelos poderes maiores, foi uma revolução minha. Foi a tomada do poder feita por mim, tirando eu mesmo da minha confortável cadeira de couro italiano e, no lugar, posto foi um banquinho de birosca, e sentei-me lá, com toda a satsifação de governar a minha nação.
Tenho um Iraque de sentimentos dentro de mim.
Estava mais do que na hora de começar a por ordem nessa bagunça toda.
Pedirei a mão de Franz Kafka em casamento.
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